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Ser mãe de um bebê anencéfalo

a dúvida frente ao diagnóstico

A anencefalia é uma realidade que muitas vezes passa despercebida, mas há um constante conflito: a dúvida das mães frente ao diagnóstico, abortar ou não? 

Consciente da situação, este especial faz uma imersão nesses casos onde o diagnóstico é, em teoria, incompatível com a vida. Para dar sustentabilidade ao conteúdo, contamos com a opinião de juristas a favor e contra ao aborto por anencefalia, frentes feministas e religiosas, relatos de mães que enfrentaram o desafio de prosseguir ou interromper a gravidez.

ANA E O DIAGNÓSTICO

por Lara Ferreira

*conto e personagens fictícios*

 

O consultório era claro, com uma temperatura agradável, tinha um gelágua no canto, algumas cadeiras e, principalmente, silêncio. À espera de sua consulta havia três mulheres grávidas, o mesmo diagnóstico, porém pensamentos, idades, ideologias e classes sociais diferentes. 

 

Ana Helena, a mais velha das três, 30 anos, tinha um  longo cabelo preto, cor parda e uma bíblia em seu colo, enquanto lia a palavra de Deus, fazia leves carícias na barriga e sorria sempre que sentia um pequeno chute ir de encontro à sua mão. Ficou feliz por descobrir que seu plano de saúde cobria consultas médicas durante a gravidez. Seu marido acabou de perder o emprego e, caso não tivesse plano de saúde, não poderia ter a ajuda necessária.

 

Ana Laura estava na idade perfeita para ter filhos, por volta dos seus 25 anos. Não havia planejado a gravidez, mas nunca reclamou quando os dois tracinhos apareceram no teste que havia comprado na farmácia ao lado do seu trabalho. Estava rolando seu feed no instagram rapidamente, quando encontrou um post sobre a marcha pró-escolha, que aconteceria poucos dias depois de seu exame, aproveitou e já compartilhou em seu stories.

 

Ana Alice era a mais nova de todas que estavam naquele espaço, com apenas 23 anos, tinha cabelos curtos e feições notavelmente belas. Ainda se sentia deslocada naquele lugar, havia casado há pouco tempo, assim como descobrira o diagnóstico há duas semanas e não sabia como iria contar para sua família sobre seu bebê, principalmente porque não tinha ideia do que faria com ele. Enquanto observava cada centímetro do consultório, passava gentilmente a mão pelo lado esquerdo da barriga tentando sentir o mínimo movimento possível, nada veio até então.

 

Rapidamente o silêncio se quebrou quando a secretária chamou um único nome, “Ana”.

ANA E O DIAGNÓSTICO

E QUANDO O DIAGNÓTICO É ANENCEFALIA
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por Lara Ferreira

A anencefalia se caracteriza por um defeito no fechamento do tubo neural, estrutura responsável pela formação do sistema nervoso. O feto não desenvolve o encéfalo e nem a calota craniana, e o cerebelo e a meninge são reduzidos. Em grande parte dos casos, o tecido cerebral fica exposto.

 

Essa malformação compromete partes importantes do cérebro, que são responsáveis pela visão, audição, coordenação de movimentos e pensamento, por exemplo. O grau de lesão pode variar de feto para feto.

 

No Brasil, a legislação permite que o aborto seja realizado apenas em casos de estupro, risco à vida da mãe ou anencefalia, como podemos observar no artigo 128 do Código Penal:

Art. 128. Não se pune o aborto praticado por médico: Aborto necessário I - se não há outro meio de salvar a vida da gestante; Aborto no caso de gravidez resultante de estupro II - se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.

 

 

O primeiro conceito tratado (Art. 128, I), é chamado de aborto necessário ou terapêutico, nesse aspecto encaixamos o aborto por diagnóstico de anencefalia. No julgamento em 2012, o STF considerou inconstitucional interpretar que a interrupção da gravidez de feto anencéfalo possa ser enquadrada no Código Penal porque violaria preceitos constitucionais como a garantia do Estado laico, da dignidade da pessoa humana, do direito à vida e da proteção da autonomia, da liberdade, da privacidade e da saúde.

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E QUANDO O DIAGNÓSTICO É ANENCEFALIA?

DO ULTRASSOM À CESARIANA

DO ULTRASSOM À CESARIANA

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Carolina Alves Lima, médica do Hospital Albert Sabin

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por Lara Maria 

e Lara Ferreira

 

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) o Brasil é o quarto país com maior índice de bebês com anencefalia tendo um caso a cada 700 nascimentos, com uma média de 615 mortes em decorrência da doença.

 

Ao se referir à incidência de  anencefalia, é comum associar com uma criança sem cérebro e logo, sem vida. Mas esse conceito é errado, já que a doença, na verdade, não é a falta total de cérebro, mas sim um processo de morte encefálica que acontece no desenvolvimento da gravidez. Como isso isso acontece? A Radiologista Carolina Alves Lima, médica do Hospital Albert Sabin, explica:

 

Pergunta: Como definir didaticamente anencefalia? 

 

Dr. Carolina Alves: Mais ou menos quando você está no início da gestação, pela quarta semana, a gente tem a formação de uma estrutura que se chama tubo neural, o tubo neural é como se fosse uma folha, mais ou menos um disco, então quando chega entre a quarta e a sexta semana de gravidez, ele vai girando para um tubo. A gente está falando de quatro semanas de gravidez, é muito pouco tempo. Então, ele vai formando um tubo, onde a parte caudal vai culminar no abdômen e pernas e a parte cranial ou rostral é o que vai gerar o pescoço, cabeça e membros superiores. Nesta fase, já dá pra dar o diagnóstico de anencefalia se você estiver fazendo o cromossomo terapia, obviamente ninguém vai diagnosticar em quatro semanas de gestação que o bebê está anencéfalo. Mas você já olha e já vê que tem algum problema.

 

Pergunta: Com quanto tempo o diagnóstico pode ser confirmado?

 

CA: Com cerca de doze semanas é possível ver o corpo dele ali, todinho. Se percebe que,  o movimento de fechar essas estruturas têm um defeito e elas não fecham. Embaixo ficam fechadas e a parte de deveria ser responsável pelo tubo neural e, posteriormente, do crânio, não fecha. Então, o que acontece é:  formam-se as estruturas internas, mas as externas estão abertas. Isso significa que a criança nasce sem aquilo que deveria gerar as tábuas cranianas (que protege o cérebro) e fechar as frontais, as temporais. 

 

Pergunta:Dessa forma, a criança desenvolverá o cérebro?

 

CA: Conforme ela vai desenvolvendo o cérebro, por esse cérebro não ter toda calota craniana ou o que seria uma calota craniana fechada, o conteúdo que está se formando de parênquima cerebral vai entrar em contato com o líquido amniótico e quando não tem esta proteção (do tubo neural), o líquido amniótico é danoso às células cerebrais e vai matando elas. Então a criança tem o cérebro, mas este vai sendo destruído. E tem o grau de destruição, quanto mais aberta, quanto menor for o material que vai se formar a calota craniana, maior o nível de destruição do cérebro.

 

Pergunta: E qual a recomendação médica a uma mãe com diagnóstico de anencefalia de seu bebê?

 

CA: Eu não acho que caiba nem a mim, nem a nenhum médico decidir o que uma mãe deve fazer, eu particularmente não aconselharia ninguém a abortar ou não abortar. Mas claro que devemos dizer: seu bebê foi diagnosticado com anencefalia e as chances de sobrevida são mínimas, agora você pode procurar um neurologista ou um médico especializado em medicina fetal.

 

Pergunta: Em alguns casos há o aborto espontâneo, por que isso acontece?

 

CA: Conforme esse cérebro vai sendo destruído pelo líquido amniótico essa criança vai tendo menos chances de sobreviver. Esse líquido é altamente doloso ao conteúdo de parênquima cerebral. As consequências disso, na gravidez, são um aborto espontâneo, entre quatro ou seis semanas, pois seu corpo identifica que algo está errado com o feto e o expulsa. 

 

De fato, a gestação pode continuar e chegar aos nove meses, nessas situações, segundo a radiologista, há duas possibilidades: a criança nascer e morrer logo em seguida ou vir ao mundo com deformações e uma bolsa, que só possui o líquido e os resíduos de células mortas. No segundo caso, já que a mesma nasceu respirando, os médicos podem entubar, manter no respirador e a família vai ter uma criança com estímulos motores, como o abrir e fechar dos olhos, porém sua tendência será a morte, pois a mesma só tem o tronco cerebral funcionando. 

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ENTRE A LEI E O MARTELO

ENTRE A LEI E O MARTELO

por Ana Paula de Bem

e Lara Ferreira

 

O jurista e doutor em teologia, Glauco Barreira Magalhães Filho, tem sua opinião formada e baseada em argumentos legais e religiosos. Barreira se posiciona totalmente contra o aborto e defende a ideia de inconstitucionalidade.

 

Segundo o jurista, o pacto internacional de São José de Costa Rica, o qual o Brasil faz parte, reconhece o aborto como crime contra a vida, por entender que toda vida precisa ser preservada e a vida uterina está desprotegida.

Outro argumento defendido pelo jurista, está no fato das leis brasileiras não reconhecerem o aborto por anencefalia como “ação excludente de ilicitude”, mas sim como “excludente de penalidade”.

 

No Código Penal Brasileiro, o que se constitui por excludente de ilicitude é quando a pessoa está livre do crime por não se reconhecer tal ação como crime. Uma gravidez na qual a mãe precisa interromper a gestação para salvar a própria vida, a lei entende como o princípio de legítima defesa.

No caso do aborto por anencefalia, o Código Penal Brasileiro diz que a ação estará livre de punição. Nesse caso, Barreira argumenta que deixar de punir não livra a ação da ilegalidade, nesse caso o aborto é considerado como uma política de abrandamento.

 

O jurista ainda defende que não reconhece a necessidade de tirar uma vida, uma vez que ela possa se fazer por processo natural 

Por que matar uma criança se isso pode ocorrer no seu fluxo natural, sem dor, sem traumas? E se essa vida realmente não estiver fada a morte?

 

Juristas e movimentos sociais refutam o argumento, afirmando que a criminalização não é compatível com as leis do país. Além disso, argumentam que as informações sobre métodos contraceptivos não chegam a todos e criticam o fato de, legalmente, apenas as mulheres serem responsabilizadas pelo aborto.

 

Na opinião do o juiz de direito José Henrique Rodrigues Torres, presidente da Associação Juízes pela Democracia em 2013, a criminalização do aborto viola diretamente princípios constitucionais e não considera o direito à vida. Esta questão já foi resolvido por várias cortes internacionais, como a Corte Interamericana de Direitos Humanos, além de países como Argentina, Colômbia e várias nações europeias. 

 

Para Torres, tratar o aborto como um crime, sujeito a punição, fere direitos constitucionais. “Não estamos conversando sobre quem é a favor ou contra. O que ocorre é que criminalização do aborto é inconsequente, produz danos e causa mortes de mulheres”, avalia. “Estamos falando em salvar vidas e em encontrar formas para evitar o abortamento fora do sistema penal. Nos países que liberaram o aborto as mulheres são acolhidas, têm atendimento e com isso muitas desistem e acabam tendo a gestação”.

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Glauco Barreira Magalhães Filho, jurista e doutor. 

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José Henrique Rodrigues Torres, presidente da Associação Juízes pela Democracia 

A ESCOLHA

ENTRE A ESCOLHA E A VIDA

Pró-escolha

por Ana Paula de bem,

Lara Maria

O Movimento Feminista possui diversas pautas em prol da equidade entre os gêneros. Uma destas pautas é a luta contra a violência de gênero. No Brasil, o aborto não é legalizado e a prática ilegal, leva a morte de diversas mulheres. A luta pela descriminalização do aborto iniciou em 1970 no país, com o discurso de tomada de poder do próprio corpo. 

 

Para Ticiana Studart, representante da Marcha Feminista no Ceará, a tomada da decisão do aborto para uma mulher, nunca vem como uma vontade, mas por alguma necessidade (classe econômica, problemas psicológicos, agressões etc). De acordo com a  ativista , o papel do movimento feminista é denunciar e lutar para que esse direito seja dado às mulheres. 

 

No Uruguai, o aborto foi legalizado em 2012, dando saídas não letais para mulheres pobres. Dados do Ministério de Saúde Pública do País, em março de 2018, houve um aumento considerável na quantidade de abortos realizados nos primeiros anos da legalização. No entanto, nos últimos anos, foi observado uma estabilidade em relação a esses números. Também no Uruguai foi registrado apenas três mortes por aborto dentro os anos de 2013 e 2016. 

 

Na Espanha, país que legalizou o aborto, os casos diminuíram após o terceiro ano de implantação da lei, em 2013. O Ministério de Saúde da Espanha reconhece que a medida continuou diminuindo entre mulheres e, em 2016, foi estabilizada. 

 

Algumas pesquisas apontam que países que regulamentaram o direito ao aborto apresentam redução na prática. Esse histórico é atribuído ao fato de esses países oferecerem  diálogo, instrução e aplicação dos métodos contraceptivos são mais amplamente realizados. 

 

No Brasil, a Pesquisa Nacional de Aborto (PNA) diagnosticou, em 2016, que aos 40 anos, quase uma em cada cinco brasileiras, já realizou, pelo menos, um procedimento. Os fatores racial, de renda e escolar são determinantes para alguns grupos minoritários.  O estudo ressalta que 22% mulheres com até quarta série/quinto ano já realizaram o abortamento. Quando se trata de renda, 16% das mulheres ganham até um salário mínimo. Quanto à raça, mulheres negras, indígenas e pardas representam mais de 50% do total. 

 

O atraso na justiça é um dos empecilhos para a realização desse procedimento. Por passar muito tempo em julgamento, as mulheres perdem o prazo para a interrupção da gravidez, apesar de o aborto de anencéfalos poder ser feito a qualquer estágio da gravidez.


Ticiana conclui que

o papel de acolhimento é do Estado, quanto ao movimento, nosso papel é de denúncia quando, por exemplo, esses casos não são respeitados

 

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Ticiana Studart, representante da Marcha Feminista no Ceará

A VIDA

Pró-vida

por Andressa Câmara

e Lara Ferreira

 

Movimentos pró-vida que lutam pela proteção vida humana, desde a concepção até a morte natural, vem crescendo cada vez mais no Brasil. Os movimentos obtiveram mais visibilidade devido a ascensão de movimentos pró-escolha, assim como as tentativas descriminalização do aborto no país. A decisão do aborto se dá por diversos motivos desde a uma gravidez indesejada a ao aborto por algum problema de saúde do bebê, como a anencefalia. 

 

Segundo George Mazza, líder do movimento pró-vida em Fortaleza,  o movimento se divide em diversos aspectos. “O movimento pró-vida se divide em diversas formas de ação sendo uma delas: as casas de atendimento e acolhimento de gestantes, que estão espalhadas por todo o Brasil que funcionam dando apoio para as gestantes que querem ou que pensaram em um dia abortar ou desistiram de abortar. Nós temos casas com profissionais de inúmeras especialidades que atendem como médico e assistentes sociais, as mulheres grávidas recebem cursos de inglês, curso de informática, corte e costura para que depois que o bebê nascer elas possam ter uma fonte de renda." pontua.

 

George explica que o acolhimento nas casa incluem os mais diversos tipos de serviço "Muitas mulheres chegam lá sem nenhuma profissão, sem capacidade de sustentar o seu filho que virá a nascer e o movimento pró-vida acolhe essas crianças, atende essas crianças, faz todos os exames, como os exames de pré-natal e a mulher recebe o enxoval completo", e continua 

Então a gente não só cuida do bebê quando ele está na barriga, temos toda uma estrutura montada em todo o Brasil para dar apoio depois que essa criança nascer.

,explica.

 

Um modo de atuação desse movimento está relacionado a política. O movimento pró-vida atuam junto a assembléia, a câmara dos vereadores e  ao congresso nacional e ao STF numa perspectiva de orientação de políticos, que se dizem pró-vida, assim como os que não conhecem a causa de visualização dos projetos, sendo essa uma tentativa do  movimento se antecipar e defender a causa numa linha política e jurídica.

 

É importante salientar que o aborto no país ainda não é legalizado, mas diversas tentativas foram realizadas tanto contra, como a favor do aborto. Há registros de iniciativas organizadas em benefício da vida dos nascituros no Brasil desde a década de 1970, mas as articulações ganharam força recentemente. Um marco da história está em 2012, quando o Supremo Tribunal Federal, STF liberou a interrupção de gravidez de feto anencéfalo, além das medidas de criminalização do aborto, com exceção dos casos de estupro e risco para mãe.

 

Além dos citados acima, outro modo de atuação da movimento pró-vida está no atendimento que é realizado nas ruas com a distribuição de panfletos e adesivas,com rodas de conversa, debates, conversa com escolas com o objetivo  de transmitir para as pessoas a dimensão que é a defesa da vida. Um dos movimentos mais conhecidos é a marcha pela vida, onde acontece uma reunião uma vez por ano, uma vez por ano em Fortaleza, além desses meios citados está na linha de formação por meio de palestras, seminários, congressos, eventos e lançamentos de livros mostrando toda a dimensão do movimento.

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George Mazza, coordenador da Marcha Pela Vida de Fortaleza

LEANDRA

A HISTÓRIA DE LEANDRA

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por Ana Paula de Bem

 

Uma das personagens desta reportagem, mas com nome fictício, é Leandra. Aos 27 anos em sua segunda gestação, recebeu o diagnóstico: gravidez de anencéfalo, por hidrocefalia. A tristeza foi instantânea. A dor de saber que não teria um filho saudável e que, em algum momento, iria perdê-lo tirava toda possibilidade de discernimento dessa mãe.

Leandra relata que tantos pensamentos ao mesmo tempo que a tornava incapaz de tomar uma decisão consciente e que, futuramente, fosse possível conviver com essa escolha. Os médicos falaram sobre a possibilidade da possibilidade de interromper a gravidez, mas em momento algum induziram ou persuadiram qualquer opinião. Seus familiares, incluindo seu marido,  ficaram abalados e escondiam suas opinião, o que por um lado foi bom, já que essa decisão não veio seguida de imposições;, mas, por outro lado, sugeriu um comodismo, eles se abstiveram de qualquer responsabilidade emocional, e isso tem um peso, observou. Por não ser praticante ativa de nenhuma religião, Leandra não sofreu esse tipo de influência.

O fato de ela já ter um filho de 5 anos também influenciou na escolha prosseguir com a gravidez ou não. Como uma mãe fala para uma criança que seu irmãozinho(a) não nasceria, pois, a mamãe interrompeu a gravidez? Ou ainda, como deixar a criança criar expectativas de um bebê que possivelmente morreria ao nascer? E nesse segundo caso, como proceder? Fazer um enxoval caso sobreviva por alguns dias? Como será essa gestação?

Com tantas variáveis, turbilhões de emoções e aflições o tempo foi passando, com isso, a decisão de Leandra se tornava mais necessária e urgente. O enjoo gestacional, as emoções potencializadas pelos hormônios da gravidez também não ajudavam, e faziam com que ela se sentisse uma grávida comum. Com a demora da decisão ficou inviável a interrupção da gestação, mas ela estava consciente de que seu bebê não sobreviveria. Com o passar dos meses, foi digerindo o fato e amadurecendo novas possibilidades, como a de doar os órgãos do seu bebê, e assim possibilitar vida a outras pessoas, seguindo assim, a Resolução do Conselho Federal de Medicina (CMF) n° 1752/2004, que prevê autorização ética do uso de órgãos e/ou tecidos de anencéfalos para transplante, mediante autorização prévia dos pais.

Passados 9 anos, Leandra reconhece que sua decisão foi a melhor que ela poderia ter tomado, tanto por ela como para sua filha e que tudo na vida tem um propósito.

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Âncora 3

por Lara Ferreira

 

No julgamento em 2012, o Supremo Tribunal Federal STF considerou inconstitucional interpretar que a interrupção da gravidez de feto anencéfalo possa ser enquadrada no Código Penal. Ela violaria preceitos constitucionais, como a garantia do Estado laico, da dignidade da pessoa humana, do direito à vida e da proteção da autonomia, da liberdade, da privacidade e da saúde.

 

“Antes mesmo de te formar no ventre materno, eu te escolhi”, assim afirma a escritura bíblica localizada no livro de Jeremias capítulo 1, declarando que interromper uma vida já conhecida e planejada por Deus é inadmissível . Segundo a doutrina cristã, cada pessoa é, desde o momento da concepção, um ser vivo único e independente. 

 

Durante a decisão do STF, sobre a legalização ou não do aborto de anencéfalos, em 2012, Douglas Roberto de Almeida Baptista, representante da Convenção Geral das Assembleias de Deus, fez a seguinte declaração: “O direito à vida não pode ser mitigado por qualquer outro direito. Essa ação, ao legalizar o assassinato de ser indefeso no ventre da mãe, não merece prosperar”. 

 

“Segundo o Catecismo da Igreja Católica, a vida humana deve ser respeitada e valorizada. Caso haja qualquer cooperação formal com o aborto, aquele que coopera comete falta grave, devendo ser sancionado com a pena de excomunhão direta. Pelos próprios dogmas e ensinamentos da Igreja Católica é incoerente um cristão se afirmar católico e lutar pela legalização do aborto e por outras pautas contrárias aos ensinamentos da Igreja Apostólica Romana.”, como afirma o livro do mestrando George Mazza “O que você precisa falar sobre o aborto”. 

NA CRUZ HÁ VIDA

Âncora 6

A DECISÃO DE ANA

por Lara Ferreira

 

A análise incomodou, e até quando Ana Alice achou que sabia a resposta...ela não veio. Já sente alguns chutes ao tocar a barriga, sabendo que aquele ser não é mais tão pequeno como antes. Sua família a olhou diferente depois que souberam, seus amigos mais ainda, os médicos? Já estava na terceira obstetra, e contando.

Encontrou com Ana Laura algumas semanas depois de se conhecerem no consultório, estava fazendo compras no shopping e já não tinha mais a barriga de grávida, na verdade parecia que nunca tivera. As duas conversaram um pouco e até marcaram de almoçar juntas, ainda não aconteceu, mas o número permanece salvo em seu celular.

Com Ana Helena foi diferente, se encontraram na saída da igreja que a mesma frequentava, acompanhada de seu marido e com a pequena Maria em seu colo. Ana Alice não deixou de perceber que a bebê estava de touca, dessa forma a cabecinha não ficava tão exposta e não atraía olhares estranhos. Cumprimentou a companheira de diagnóstico e a mesma lhe deu um abraço, trocaram números e mais uma vez um almoço entrou em pauta.

Hoje, Ana Alice acordou decidida, conversou com seu marido e ele a apoiou na decisão, contou para família, para os amigos e para sua médica, olhares diversificados vieram, mas isso não a incomodava mais. Sentia que não podia seguir adiante sem fazer uma última ligação, então pegou o celular procurou o nome em sua agenda e apertou no pequeno telefone verde. Chamou, chamou e uma voz conhecida atendeu com um “alô”, logo respondeu “Oi aqui é Ana Alice, quem está falando é a Ana?”.

Âncora 4

*As personagens: Ana Alice, Ana Laura e Ana Helena são fictícias, com biotipos, classes sociais e econômicas baseadas em artigos e pesquisas que dissertam sobre o perfil de cada mãe que recebe o diagnóstico de anencefalia dos bebês*

Âncora 5
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